160 anos da publicação das Viagens na Minha Terra.
Para quem lê Garrett, para quem leu e releu As Viagens na Minha Terra, não pode deixar de constituir uma amarga ironia a demolição, agora completamente consumada, da sua casa da antiga rua de Santa Isabel. Porquê? Porque quem leu Garrett, quem leu as Viagens, sabe quanto o escritor se indignava, com romântica veemência, com a degradação e a destruição do património, com os crimes de descaso e de esquecimento.
Ouçamos a reacção do narrador das Viagens ao deparar com as ruínas do profanado Convento de S. Francisco de Santarém:
«Decididamente vou-me embora, não posso estar aqui, não quero ver isto. Não é horror que me faz, é náusea, é asco, é zanga.»
E um pouco mais à frente:
«Em Portugal não há religião de nenhuma espécie. Até a sua falsa sombra, que é a hipocrisia, desapareceu. Ficou o materialismo estúpido, alvar, ignorante, devasso e desfaçado, a fazer gala de sua hedionda nudez cínica no meio das ruínas profanadas de tudo o que eleva o espírito...
Uma nação grande ainda poderá ir vivendo e esperar por melhor tempo, apesar desta paralisia que lhe pasma a vida na mais nobre parte de seu corpo. Mas uma nação pequena, é impossível; há-de morrer.
Mais dez anos de barões e de regímen da matéria, e infalivelmente nos foge deste corpo agonizante de Portugal o derradeiro suspiro do espírito.
Creio isto firmemente.»
As Viagens foram publicadas há precisamente 160 anos.
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